O Brasil será grande outra vez?


Os mercados emergentes[1], enquanto conceito, tiveram início em 1987, ou seja, estariam completando hoje 30 anos. Em 1988, o MSCI Emerging Markets[2], índice que acompanha a performance destes mercados, começou a ser mensurado. Inicialmente, esse índice incluía poucos países e, surpreendentemente, Brasil e Malásia representavam quase 50% do total, por razões de liquidez escassa na maioria das bolsas emergentes. A China era praticamente inexistente, assim como a Índia, enquanto que o mercado da Coreia do Sul era relativamente fechado.
Depois dessa breve introdução, vamos avançar na linha do tempo, para o ano de 2008. Nesse ano, as commodities representavam quase 50% do índice MSCI. O Brasil tinha aproximadamente 15%, sendo mais representativo do que a China, devido à falta de liquidez que o mercado chinês oferecia.
Agora, vamos avançar mais alguns anos na linha do tempo, chegando aos dias atuais. As commodities, que antes eram o principal ativo que compunha o índice, tiveram sua participação reduzida para apenas 15%. Por outro lado, a tecnologia deu um grande salto e passou a representar 25% do índice.
Regionalmente, a Ásia passou a dominar, em termos absolutos, participando com 70% do total, em comparação aos 50% de 10 anos antes. A China, antes pouco significativa, passou a ser o maior mercado, com 25%, seguida por Coreia e Taiwan. O Brasil, por sua vez, caiu para 8%, o que é praticamente a metade do ano de 2008.
Dentre as 10 maiores empresas do MSCI Emerging Markets, 6 são do setor de tecnologia, sendo as quatro primeiras: Samsung, Tencent, Taiwan Semiconductors e Alibaba. Seis dessas 10 empresas são chinesas, duas são de Taiwan, uma é da Coreia do Sul e apenas uma delas está fora da Ásia, a Naspers, da África do Sul, também na área de tecnologia.
Mas qual a razão para essa mudança? A queda dos preços de commodities a partir de 2011, com os preços de petróleo e minério de ferro despencando de US$ 150 por barril e por tonelada, para os atuais US$ 50 / barril e US$ 60 / t, respectivamente, o que explica a débâcle do peso das commodities e do Brasil no índice.
Mas será que a mudança dos pesos estaria novamente levando a gangorra para o extremo oposto? Será que estamos mais uma vez a caminho de uma nova bolha de ações de tecnologia, como ocorreu no ano 2000?
Tudo indica que sim. Basta observar o comportamento das FANGS, as cinco maiores empresas high tech dos Estados Unidos, cujo valor conjunto quase triplicou nos últimos 5 anos, ultrapassando os US$ 3 trilhões.
Estamos falando aqui de Facebook, Amazon, Netflix, Google e Apple, que também estão entre as maiores empresas do mundo por valor de mercado. Essa lista não inclui a Microsoft. Dentre essas empresas, a mais antiga é a Apple, que só começou a voar há 15 anos, enquanto que todas as outras têm menos de 20 anos de história. Sem dúvida, essas empresas representam uma revolução. Contudo, ao pagar 180 vezes o lucro pelas ações da Amazon, o mercado está precificando a perfeição, ignorando os riscos de uma nova ruptura tecnológica, maior regulação e taxação ou, simplesmente, frustração com os resultados.
Não acreditamos que tenhamos um novo boom de commodities, nem tampouco que estas continuem a cair. Também não acreditamos que as ações de tecnologia continuem a performar acima da média. Talvez, o futuro das ações de mercados emergentes realmente esteja com as empresas de consumo, visto que o potencial de crescimento populacional e de aumento de renda concentra-se nessa parte do planeta.
Apesar de representarem 50% do PIB mundial, os mercados emergentes são hoje apenas 10% da capitalização global. Ainda há muito que progredir, sem ignorar o fato de que as principais multinacionais têm apenas sua sede em países desenvolvidos, o que significa que estão presentes nos mercados emergentes.
Oitenta por cento do crescimento do PIB mundial vem de países emergentes, especialmente da Ásia. Apesar da desaceleração das economias da China e da Índia, o crescimento destes países ainda deve ser maior do que o dos Estados Unidos, Europa e Japão por um período prolongado. Isso se deve ao fato de que a renda per capita nestes países é de menos de um terço da renda per capita dos países desenvolvidos.
Portanto, acreditamos que o Brasil terá muito espaço para recuperação, uma vez superadas as crises política e fiscal. Não teremos mais o bônus das commodities, mas continuaremos sendo um grande produtor agrícola e poderemos aumentar a nossa participação nos mercados de petróleo e de minerais. Nosso crescimento em área plantada irá nos manter como o celeiro do mundo e garantir nossas contas externas, sem dessa vez provocar a Doença Holandesa[3], do excesso de apreciação cambial.
É importante lembrar ainda que o grande sucesso e crescimento dos países asiáticos se deu pelo investimento em educação, o que é uma questão primordial até hoje. O Brasil deu seu primeiro passo nesse sentido, com a aprovação da mudança curricular. Porém, ainda há muito a ser feito antes de atingir o nível alcançado pelos países asiáticos.
Com isso, partes de nossa indústria e de nossos serviços também podem recuperar sua participação no bolo mundial. O Brasil tem um imenso espaço de capacidade ociosa, que nos permite crescer sem inflação e recuperar a credibilidade na curva de endividamento.
Não conseguiremos reaver a participação que tínhamos nos anos 90, ou em 2008, mas acreditamos que, provavelmente, o domínio absoluto da Ásia tenha atingido seu pico, especialmente no que tange às empresas de tecnologia. A reversão para a média já ocorreu com as empresas de commodities, e deve ocorrer também com as empresa de high tech. Não existe moda que produza milagre no longo prazo.


[1] Nos dias de hoje, são definidos pelos países emergentes, por possuírem um rápido crescimento econômico, industrial e de modernização.
[2] Índice construído pelo Banco de Investimentos Morgan Stanley.
 [3] Em economia, Doença Holandesa é a relação entre a exportação de recursos naturais e o declínio do setor manufatureiro. Geralmente, ocorre em países que têm recursos naturais em abundância e exportam em grandes quantidades, causando a valorização cambial, o que prejudica a competividade de seus produtos industrializados.